CNJ – Tribunais se comprometem com o combate à corrupção

Investimentos em tecnologia para desenvolvimento de sistemas que elevem a eficiência no registro de comunicações eleitorais e facilitem a identificação e exame de crimes contra o sistema financeiro; criação de forças-tarefas para agilizar julgamentos de ações de improbidade administrativa; e implementação de programas para prevenção de atos de corrupção e promoção de conduta ética. Com iniciativas como essas, o Poder Judiciário se prepara para ampliar o “enfrentamento à corrupção, à improbidade administrativa e aos ilícitos eleitorais” e cumprir os objetivos previstos no quarto macrodesafio da Estratégia Nacional do Poder Judiciário 2021-2026.

As medidas, desenvolvidas por diferentes tribunais de regiões distintas do Brasil ou capitaneadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), estão focadas na correta aplicação dos recursos públicos, na garantia de realização processos eleitorais íntegros e na preservação da probidade administrativa. E revelam o compromisso do Poder Judiciário com o combate à corrupção, fenômeno global que amplia as desigualdades e afeta com mais intensidade os menos favorecidos ao drenar recursos públicos com reflexos nos custos e qualidade dos serviços fornecidos pelo estado.

Para cumprir o macrodesafio, uma das formas é os tribunais priorizarem a tramitação dos processos judiciais que tratem do desvio de recursos públicos, de improbidade e de crimes eleitorais, além de adotar medidas administrativas relacionadas à melhoria do controle e fiscalização interna e externa do gasto público no Poder Judiciário. A implementação de ações voltadas para a superação do desafio inspirou diferentes iniciativas que, além de criativas e eficientes, contribuem para o combate à impunidade e criação de um ambiente mais saudável na administração pública.

A tecnologia é uma das aliadas do Judiciário no combate aos ilícitos eleitorais. A adoção do Sistema de Informações de Óbitos e Direitos Políticos (Infodip) pela Justiça Eleitoral elevou a eficiência no registro, recebimento e processamento das comunicações de óbito, suspensão e/ou restabelecimento de direitos políticos e hipóteses de inelegibilidades, permitindo a tramitação eletrônica interna e externa de tais comunicações.

Criado em 2013 pelo Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) e adotado por 23 cortes, o sistema se encontra em fase de nacionalização. A determinação foi estabelecida na Portaria nº 1/2021, iniciativa conjunta do CNJ e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que centralizará e disponibilizará a base de dados do Infodip para toda a Justiça por meio de webservices.

A integração elevará a qualidade da informação sobre improbidade administrativa, além de facilitar o trabalho dos órgãos responsáveis pelo registro de condenações por improbidade. Eles terão que comunicar apenas ao Infodip, que armazena também dados sobre condenações criminais. O cruzamento dos dados disponíveis no sistema permite saber se determinado candidato possui impedimentos em qualquer unidade da Federação e, assim, impedir que quem teve direitos políticos suspensos num determinado local busque mandato eletivo em outra parte do país.

O Infodip figura no Portal CNJ de Boas Práticas do Poder Judiciário e também recebeu o Selo CNJ de Desburocratização. Com o objetivo de tornar o sistema ainda mais robusto, estão em curso modificações para que incorpore o Cadastro Nacional de Condenados por Ato de Improbidade Administrativa e por Ato que Implique em Inegibilidade (CNCIAI).

De acordo com o corregedor e vice-presidente do TRE-PR, Vitor Roberto Silva, antes do Infodip, a comunicação de todos os fatos que impactavam os direitos políticos ou a própria condição do eleitor era feita por correspondência “de papel”. Segundo ele, para implementação da comunicação eletrônica foram estabelecidos convênios com cartórios e todos os órgãos comunicantes nas varas criminais, federais, cíveis e conselhos profissionais. “Essas comunicações representavam 80% de todos os protocolos da Justiça Eleitoral. O processamento demandava tempo e trabalho de servidores qualificados.”

O Infodip também reflete nos custos e as estimativas apontam que, em oito anos de funcionamento, o sistema gerou economia superior a R$ 58 milhões para o Poder Judiciário com a eliminação da correspondência física. Antes da adoção do sistema, o envio de comunicações entre zonas eleitorais de estados distintos era intermediado pelas Corregedorias Regionais Eleitorais. O custo médio da correspondência girava em torno de R$ 10 e ainda gerava um elevado volume de documentos e rotinas burocráticas.

Vitor Silva explica que, por meio do Infodip, cartórios de Registro Civil e as Justiças Federal, Eleitoral e Estadual trocam informações sobre óbitos, condenações criminais e cumprimentos de pena que podem impedir o exercício dos direitos políticos. “Além de detectar inegilibilidade de candidatos, o sistema possibilita que sejam acessadas informações sobre outras condenações criminais, extinção de punibilidade, cumprimento do serviço militar obrigatório e óbito, bem como condenações por órgãos colegiados por rejeição de contas ou por demissão do serviço público e perda de cargo eletivo.”

O magistrado observa que, além da economia de recursos, de papel e trabalho de servidores, o Infodip deu celeridade ao cumprimento das decisões judiciais. proporcionou segurança, celeridade e eficiência na atualização do cadastro eleitoral. “Muitas vezes, essa comunicação era demorada e, por exemplo, se uma estivesse com direitos políticos suspensos que a impediria de se candidatar, não se encontravam óbices, porque a anotação não constava do cadastro eleitoral.”

Dessa forma, esclarece, a Justiça impede a eleição de quem não pode concorrer e não comete a injustiça de indeferir a candidatura de um cidadão que está apto a disputar. “Os principais objetivos do sistema foram alcançados, que são eficiência e eficácia na manutenção do cadastro atualizado.”

O corregedor eleitoral também ressalta que o Infodip eleva a fidelidade do cadastro eleitoral ao automatizar os dados de óbitos pelos cartórios. Sem essas informações, a Justiça Eleitoral não cancelava o registro do eleitor e ficava aberta a possibilidade de alguém, por meio de documento falso, tentar votar utilizando o Título Eleitoral de quem faleceu.
De acordo com Vitor Silva, uma comunicação de óbito demorava, em média 30 dias, para constar no cadastro eleitoral antes da adoção do Infodip, prazo que o sistema reduziu para três horas. “A possibilidade de fraude fica eliminada.”
O desembargador ressalta que o uso da tecnologia elevou exponencialmente a fidelidade do cadastro da Justiça Eleitoral, que se converteu em “um dos principais cadastros disponíveis no país”. Segundo ele, o elevado grau de autenticidade fez com que muitas prefeituras recorressem ao cadastro eleitoral para organizar a vacinação contra a Covid-19 nos municípios.

Sniper
O Sistema Nacional de Pesquisa Patrimonial e Recuperação de Ativos (Sniper) é outra iniciativa do Poder Judiciário voltada ao combate à corrupção por meio do uso de tecnologia. Desenvolvido no âmbito do Programa Justiça 4.0 – um dos eixos da gestão do presidente do CNJ, ministro Luiz Fux –, o Sniper é uma plataforma digital voltada para a pesquisa e recuperação de ativos em processos envolvendo crimes complexos contra sistemas financeiros, como corrupção e lavagem de dinheiro.

O sistema vai auxiliar magistrados e servidores na conclusão de processos que se encontram em fase de execução. Isso porque vai possibilitar o cruzamento de informações armazenadas em diferentes bases de dados – abertas ou fechadas – para detecção de vínculos societários, patrimoniais e financeiros existentes entre pessoas físicas e jurídicas.

Ao realizar o cruzamento de dados, a plataforma viabilizará a localização de ligações societárias não perceptíveis por meio de análises exclusivamente documental, efetuadas a partir de uma decisão judicial. O Sniper vai explorar graficamente vínculos variados, possibilitando a conclusão de investigações com maior rapidez e eficiência. A ação vai incidir na diminuição do acervo e no congestionamento processual na fase de execução.

De acordo com o juiz auxiliar da Presidência do CNJ Dorotheo Barbosa Neto, a adoção do Sniper vai ampliar a efetividade do combate à corrupção. “Nos processos penais com investigações financeiras complexas, respeitando o papel imparcial do magistrado, o sistema dará melhor compreensão da prova técnica produzida, facilitando a análise pelos serventuários da Justiça e magistrado. Não há produção de prova nova, mas sim, visão sistêmica das provas produzidas.”

O magistrado esclarece que a plataforma vai facilitar a compreensão da prova produzida na busca e recuperação de ativos em processos judiciais. “Possibilitará uma visão sistêmica da prova processual e a compreensão visual do quadro de patrimônio da pessoa investigada ou processada, podendo ser assim utilizado em processos cíveis e penais e, principalmente, na fase de execução de sentença, que é o principal gargalo do Poder Judiciário.”

A empresa de tecnologia que fará o desenvolvimento da plataforma já foi escolhida por meio de licitação e deverá transferir a tecnologia para o CNJ. Ainda neste semestre, o primeiro módulo entra em operação e, de acordo com Dorotheo Barbosa, a previsão é que o sistema completo esteja em funcionamento em 2022.

Forças-tarefa
A formação de forças-tarefa foi a solução adotada pelo Tribunal de Justiça de Roraima (TJRR) para reduzir o acervo de ações de improbidade administrativa e ações penais relacionadas a crimes contra a administração pública. Dessa forma, o Tribunal conseguiu, no ano passado, superar a meta de julgamentos de processos de improbidade em 107,7% e em 127,8% a meta de julgamentos de crimes contra a administração pública. As decisões contribuíram para a recuperação, aos cofres públicos, de cerca de R$ 10,6 milhões.

As equipes do TJRR são integradas por assessores jurídicos e oficiais de justiça cuja atuação prioritária está voltada ao julgamento desses processos. O trabalho se inicia com o mapeamento das ações e conta com a participação da Corregedoria de Justiça, que atua no monitoramento e orientação das atividades realizadas em cada vara e comarca do estado.

De acordo com o presidente do tribunal rondoniense, desembargador Cristóvão José Suter Correia da Silva, paralelamente à expansão no número de julgamentos, verificou-se uma redução significativa de novos casos envolvendo improbidade administrativa e crimes contra a administração pública. O magistrado destaca que no ano de 2019 eram, aproximadamente, 153 processos relativos à improbidade administrativa e 79 referentes a crimes contra a administração pública. Em 2020 registrou-se um acervo de 125 e 59, respectivamente, para julgamento.
“É preciso entender que o acervo é dinâmico, uma vez que os processos suspensos saem da meta e os processos que voltam da suspensão passam a contar para a meta”, explica. Ele observa ainda que a pandemia da Covid-19 contribuiu para essa queda significativa, mas aponta que a elevação da eficiência do tribunal na realização de julgamentos é um fator que não pode ser menosprezado na análise dos dados. “Não é possível afastar a possibilidade da entrega jurisdicional realizada ter favorecido esse cenário de coibição.”

O presidente do TJRR enfatiza que o estabelecimento da Estratégia Nacional promove diversos benefícios para o Judiciário. “Principalmente questões relacionadas com a promoção de novas políticas judiciárias e melhoria da prestação jurisdicional, tendo em vista o diagnóstico realizado entre as cortes brasileiras por meio de relatórios consolidados”. Como exemplo, ele cita o Relatório Justiça em Números, que permite a visualização do panorama e necessidades do judiciário. “Com esse diagnóstico, são traçadas as estratégias para o correto atendimento, por meio do estabelecimento de macrodesafios a serem enfrentados em âmbito nacional.”

Integridade
A ação do Poder Judiciário no combate à corrupção não se restringe ao público externo. Também são desenvolvidas ações com o objetivo de prevenir, detectar, punir e remediar fraudes e atos de corrupção, além de promover a conduta ética dentro dos próprios tribunais. Com esse objetivo, o Plenário do CNJ aprovou, em agosto, resolução que instituiu o Sistema de Integridade do Poder Judiciário, com a definição de diretrizes a serem seguidas pelos tribunais na definição de seus respectivos planos de integridade.

Precursor na adoção da iniciativa, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) já conta com o Programa de Integridade, que é composto por um conjunto de políticas, ferramentas e ações com o objetivo de manter a instituição em conformidade com as leis e com a ética. Iniciativa pioneira entre órgãos públicos, o programa ganhou reconhecimento, é replicado em outros tribunais e foi adotado pela Controladoria Geral da União (CGU) como modelo para aplicação nos municípios brasileiros.

O desembargador Henrique Abi-Ackel Torres, do tribunal mineiro, destaca que a ação ultrapassa a prevenção de práticas de corrupção. “O Programa de Integridade do TJMG diz respeito a uma série de normas de condutas e orientações que vão muito além da atividade-fim do Poder Judiciário que é a prestação jurisdicional. O magistrado tem uma série de obrigações que envolvem medidas administrativas, gestão de pessoas e contratação de serviços. Orientado, ele poderá exercer essas funções com maior tranquilidade, o que redundará também na melhor prestação jurisdicional.”

O programa se baseia em sete mecanismos, que incluem o Comprometimento da Alta Direção, Código de Conduta, Canal de Comunicação (Fale com TJMG), Gestão Periódica de Riscos, Treinamentos Periódicos, Comunicação e Monitoramento Contínuo. Também conta com o Comitê de Integridade, constituído para aprimorar ações de combate à corrupção, promoção de conduta ética e implementação do programa no Poder Judiciário do estado. Ele prevê a adoção de uma Política de Integridade para Contratações; Recrutamento de Servidores; e Gestão de Riscos, cujo objetivo é manter os gestores atentos a questões com potencial para influenciar, de forma negativa ou positiva, o alcance dos objetivos do tribunal.

Abi-Ackel explica que o programa estimula a busca das melhores práticas para as atividades-meio como, por exemplo, a escolha de prestadores de serviços. “O magistrado que precisa autorizar um serviço em uma unidade judiciária vai recorrer a prestador credenciado e seguir uma série de condutas para que a prática esteja de acordo com os melhores padrões de integridade”, afirma. De acordo com o desembargador, ao seguir o Programa de Integridade para realizar contratações ou estabelecer relação com serventuários, o juiz terá mais tranquilidade para se dedicar à prestação jurisdicional.

Ele destaca que o exercício da atividade jurisdicional é acompanhado pelas Corregedorias e regulada por uma séria de normas que incluem a Lei Orgânica da Magistratura (Loman) e resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). “Para que não haja confusão, é preciso observar que o Programa de Integridade é voltado para atividades-meio. É preciso cuidado para que, eventualmente, alguém que perdeu uma demanda possa pensar, equivocadamente, que dispõe de mais um canal para recorrer.”

O desembargador observa que o magistrado e magistrada fazem muito mais que cuidar da questão jurisdicional e, questiona se alguém se lembra que eles têm que contratar profissionais para cuidar de manutenção da unidade judiciária ou cuidar da gestão de pessoas. Ele observa que são serviços necessários e aponta que, a partir do momento que a população percebe que tudo é feito de maneira íntegra, cresce a confiança no Poder Judiciário. “É uma construção que não acontece de um dia para o outro. O Programa de Integridade nos aproxima da sociedade por meio de um contexto muito maior que envolve aspectos como governança e transparência.”

Jeferson Melo
Agência CNJ de Notícias