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Migalhas – Artigo: Pessoas trans e a lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) – Por Augusta Scheer

A autodeterminação informacional, fundamento dos regimes de proteção de dados, corrobora a diversidade de identidades de gênero, contribuindo para tutelar os direitos das pessoas trans.

São trágicas e ultrajantes as estatísticas da violência contra pessoas trans no Brasil: a expectativa de vida de uma pessoa trans não passa de 35 anos; e o país segue ocupando o lastimável 1o lugar mundial no ranking dos assassinatos de pessoas trans.1

Nesse cenário, infelizmente, são corriqueiras as notícias de violações e homicídios perpetrados contra pessoas trans em virtude do preconceito contra sua identidade de gênero – vale dizer, simplesmente porque não se conformam à cisnormatividade.

As pessoas trans têm cerceadas suas oportunidades de inserção na economia e na sociedade – relegadas à marginalidade, enfrentam toda sorte de violências. De fato, o Brasil falha miseravelmente em garantir-lhes direitos elementares.

Nesse contexto, a adoção da lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) pode contribuir para melhorar a qualidade de vida das pessoas trans e ampliar o acesso destas a seus direitos, promovendo uma existência digna aos indivíduos trans e auxiliando no combate à discriminação baseada em identidade de gênero.

Entretanto, vale frisar que, para que isso ocorra, a aplicação do regime de proteção de dados no Brasil deve levar em consideração as necessidades específicas da população trans – nesse sentido, a adoção da LGPD deve ser encarada como uma oportunidade de, finalmente, com séculos de atraso, promover a cidadania e a inclusão plena das pessoas trans na sociedade brasileira.

Fato é que as pessoas trans deveriam gozar de total isonomia, segundo os ditames da Constituição Federal – consequentemente, deveria haver políticas públicas voltadas à população trans para que esta pudesse usufruir dos mesmos direitos garantidos às pessoas cis.

Em outras palavras, os direitos formalmente garantidos às pessoas trans pelas leis brasileiras dificilmente são efetivados, culminando nas inúmeras violações aos direitos humanos das pessoas trans em terras brasileiras.

Desse modo, não se pode falar no assunto sem salientar a dívida histórica que a sociedade brasileira tem com a população trans.

Num cenário de positivação de novos direitos, representado pela criação de um regime brasileiro de proteção de dados, não se pode deixar de mencionar a dificuldade enfrentada pelas pessoas trans em exercer direitos historicamente previstos no ordenamento jurídico brasileiro – dentre os quais se inclui o direito à privacidade.

Em sua origem, que remonta a um artigo dos juristas Warren e Brandeis2 datado de 1890, o direito à privacidade foi concebido como um direito de “ser deixado a sós.”

Dessa forma, a positivação do direito à privacidade já deveria ter assegurado às pessoas trans o reconhecimento de sua identidade de gênero, com todas as consequências jurídicas disso decorrentes, como, dentre outras, o direito à alteração do registro civil – pois a identidade de gênero pode ser considerada um aspecto privado da pessoa, em relação ao qual o Estado deveria se abster de toda e qualquer intervenção, em nome do respeito às liberdades individuais, necessário em qualquer sociedade que se pretenda democrática.

O direito à proteção de dados, que muitos erroneamente consideram um mero desdobramento do direito à privacidade, corrobora essa noção, mas a expande significativamente.

Em verdade, o direito à proteção de dados se configura como um direito autônomo, que, embora esteja intrinsecamente relacionado ao direito à privacidade, é dotado de uma lógica diferente, não podendo, portanto, ser considerado uma mera “subdivisão” do direito à privacidade – visto que introduz a ideia de autodeterminação informacional.

Originalmente concebida pela Corte Constitucional Alemã nos anos 80, a ideia de autodeterminação informacional fundamenta todo o regime europeu de proteção de dados. Pode ser descrita como “a autoridade do indivíduo para decidir por si mesmo, com base na ideia de autodeterminação, quando e em que limites as informações sobre sua vida privada devem ser comunicadas a outros.”3

Ao enfatizar o direito de os indivíduos exercerem autonomia sobre suas informações pessoais – podendo, sempre que possível, retirar o consentimento que autoriza tratamentos de dados, bem como determinar quais entidades terão acesso a quais dados pessoais – os regimes de proteção de dados oferecem o suporte necessário (numa sociedade cada vez mais marcada pelo domínio das tecnologias digitais) para o livre desenvolvimento da personalidade e para a dignidade da pessoa humana.

É sob o prisma da autodeterminação informacional que os regimes de proteção de dados podem contribuir em muito para assegurar direitos às pessoas trans.

Num mundo marcado pela prevalência cada vez maior das tecnologias digitais, é fundamental que a incorporação do direito à proteção de dados à prática de nossas sociedades seja acompanhada de uma reflexão sobre a necessidade de reconhecer e tutelar identidades de gênero que divergem da cisnormatividade.

Sob o prisma da autodeterminação informacional, é dado pessoal toda informação que possa identificar uma pessoa natural, seja de forma isolada ou combinada com outras informações. Para tutelar as pessoas trans, nesse contexto, deve-se fortalecer o reconhecimento à sua identidade de gênero, pois a positivação dos regimes de proteção de dados ocorreu justamente para resguardar a própria personalidade do ser humano, “projetada” pelas informações pessoais que o identificam o podem vir a identificá-lo.4

Já que o intuito, ao reconhecer uma nova dimensão de autonomia (a autodeterminação informacional), é resguardar os indivíduos de ameaças típicas de uma sociedade altamente informatizada, é fundamental levar em consideração uma das parcelas mais marginalizadas e oprimidas da atualidade.

Caso contrário, estar-se-á diante de interpretações da LGPD que perpetuam desigualdades e cerceiam direitos justamente daqueles que mais carecem da proteção que a lei pretende oferecer.

Nesse sentido, o direito, outorgado aos titulares de dados, de corrigir dados incompletos, inexatos ou desatualizados deve ser amplamente operacionalizado de modo assegurar o reconhecimento da identidade de gênero das pessoas trans, bem como a alteração do registro civil, dentre outras medidas que possam aliviar a opressão historicamente praticada contra essa população.

Mais do que isso, a ideia de autodeterminação informacional, que representa o reconhecimento e positivação de uma nova margem de liberdade individual – extremamente necessária para a democracia nas sociedades contemporâneas – deve respaldar a diversidade de identidades e expressões de gênero, positivando o respeito às pessoas trans e promovendo sua cidadania de maneira ampla e irrestrita.

Como lei atenta aos desafios contemporâneos, a LGPD não pode deixar de oferecer tutela específica às pessoas trans – vale dizer, enquanto a LGPD não for interpretada da maneira que melhor permita combater desigualdades, seu propósito de enfrentar problemas típicos da atualidade não será concretizado.

Referências:

1 Disponível aqui.

2 WARREN, Samuel D.; BRANDEIS, Louis D. The right to privacy. Harvard law review, v. 4 .

3 GUTWIRTH, Serge et al. Reinventing data protection? Springer, 2009.

4 MALDONADO, Viviane. BLUM, Renato. LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais Comentada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais.

*Augusta Scheer é advogada associada ao escritório Kanayama Advocacia, especializada em proteção de dados e direitos humanos. LL.M. em Direito e Tecnologias Digitais pela Universidade de Leiden e Bacharel em Direito pela UFPR.

Fonte: Migalhas